Memórias de uma Mulher Macaca - capítulo 1
"Sou metade macaca e metade humana. Não, não digo isso no sentido em que somos todos descendentes de um ancestral símio. Não. Eu sou, literalmente, um híbrido, uma quimera: metade macaca e metade humana. Não que isso seja uma novidade..."Esta semana estreei lá no Mix Brasil minha web-novela "Memórias de uma Mulher Macaca". Uma espécie de autobiografia fantástica que estou escrevendo na forma de folhetim.
Clique e leia. A cada 15 dias colocarei um novo capítulo.
Marcadores: Mulher Macaca
Dias de folia
coluna GLS publicada na Revista da Folha em 10/02/2008
por Vange Leonel Ela se olhou no espelho e viu sua imagem ao contrário. Seu braço direito era esquerdo, todo seu lado esquerdo era direito, mas, no fundo, sabia que o contrário dela era ela mesma. Apenas seus lados estavam trocados.
Entusiasmou-se com seu reflexo e resolveu atravessar o espelho, vivendo seu oposto, além do destro e do sinistro. Tomaria posse do outro sexo que, sentia, vivia sufocado dentro de si.
Tirou da gaveta um pé de meia que enrolou até formar um cilindro firme e macio. Depois, vestiu uma cueca do marido e acomodou o cilindro entre as pernas, como se fosse membro do próprio corpo.
Com rímel à prova d'água, ainda diante do espelho, desenhou costeletas, contornando a face, e um bigode. Antes, depilava o buço. Assaltou o armário à cata de calças, atou uma faixa bem justa em volta do tórax e sentiu-se feliz por ter seios tão pequenos que pudesse esconder.
Ouviu a batucada ao longe e saiu para a rua. Jogou-se no samba e foi mais um (uma?) no bloco dos travestidos. Por cinco dias, ficou à mercê de sua fantasia, esfregando-se nas moças, engolindo confetes e bebendo até cair. Pelo menos durante o Carnaval, esqueceu-se de que era mulher.
Quando a quarta-feira chegou, já não era homem e nem voltaria a ser mulher. Era apenas ela, sem espelho, sem fantasia ou membro de qualquer tecido. Descobriu que todo mundo merece, ainda que uma vez ao ano, se livrar de rótulo, gênero, sexo, classe, raça, tarja e categoria.
© Folha de S.Paulo
Marcadores: coluna GLS Folha
Gays não-praticantes
coluna GLS publicada na Revista da Folha em 20/01/2008
por Vange Leonel Não faz muito tempo, os pastores da Santa Sé resolveram abrandar sua condenação aos homossexuais. Numa atitude conciliatória, a igreja decidiu acolher os fiéis homossexuais, embora a prática da homossexualidade continuasse a ser vista como anomalia e afronta à moralidade cristã. Ou seja: segundo a ortodoxia católica, você pode ser homossexual, desde que não pratique a homossexualidade.
Curiosamente (mera coincidência?), a programação da TV aberta brasileira parece seguir diretrizes religiosas. De uns tempos para cá, emissoras adotaram uma atitude mais "liberal", mostrando em suas novelas personagens gays sem estereótipos e não fadados aos finais trágicos de outrora.
Sem dúvida, a atitude de apresentá-los como pessoas até "normais" é bem-vinda. Mas, a exemplo da igreja, as novelas (ou seriam seus telespectadores e patrocinadores?) não admitem personagens gays e lésbicas praticando sua homossexualidade. Enquanto beijos heterossexuais são ostensivamente colocados no ar, os gays da TV só se beijam fora de cena. São, digamos, homossexuais não-praticantes.
Por falar nisso, circulam boatos na internet de que a casa do "Big Brother Brasil 8" abriga dois gays e duas lésbicas. Por enquanto, apenas o psiquiatra Marcelo assumiu sua homossexualidade diante das câmeras. Desconfio que, mesmo que outros participantes saiam do armário, serão poucas as chances de rolar beijo homossexual no horário nobre da TV aberta. Eu não vou pagar pra ver.
© Folha de S.Paulo
Marcadores: coluna GLS Folha